2.5.05

Clotilde

Está tudo lá, que eu sei. Não me perguntem como, mas eu sei... A alameda de carvalhos e sobreiros, as casas de pedra atrás do riacho, a fonte com a melhor água da região e a ruazinha estreita e torta que acolhe uma portinha azul, com postigo, sim senhor.

E se alguém ali bater, há de vê-la aparecer pela pequena janela, e por certo há de ser recebido por ela, que agora não se veste mais de encarnado. Como uma moura, traz um lenço negro na cabeça atado ao queixo, e mesmo sob o escaldante sol do verão resignadamente enverga o luto pelo nosso amado José.

Mas espia com atenção, porque ainda hás de ver um brilho em seus olhos. Ela o convidará a entrar para um golito de vinho e com alguma sorte estará partindo um pão quentinho. Não qualquer um, mas o melhor, mais redondo e cheiroso pão já devorado por um mortal. Aceita, e aproveita para sorver com os olhos, os poros e a alma tudo o que lhe for ofertado. Olha que casica mais linda, e repara no fuso perto da escada, por onde surge um gordo novelo de lã enegrecida. Olha que lindos pratos ela tem nas paredes amareladas, e como a cor ainda fala no chão e faz seu caminho até o lume. Então enche os pulmões por mim, com o aroma da marmelada no tacho e os chouriços que pendem do teto.

Escuta suas histórias e acima de tudo, pensa em mim, quando ela abrir as portas de madeira do pequeno recinto para lhe mostrar o seu maior tesouro: um bezerrinho, acabadinho de nascer.

Leva até ela o meu abraço e o meu amor eterno...

2 comentários:

Anônimo disse...

Arrepiei.

Anônimo disse...

Que lindo, que lindo!
Fiquei emocionada.
Fique bem, querida.